As possibilidades de criatividade da Banda Desenhada estão bem visíveis nesta prancha, que ultrapassa qualquer hipótese de cena em Teatro e até mesmo no Cinema, porque a simultaneidade da imagem do intérprete com a sequência de luta, só é mesmo possível na BD
Uma peça teatral como argumento para banda desenhada é pouco frequente entre nós, e até mesmo no estrangeiro (*). Mas é disso mesmo que trata O Crime de Arronches (**), uma adaptação à Figuração Narrativa realizada por Eugénio Silva da peça homónima de Henrique Lopes de Mendonça.
Localizada no Alentejo, a vila de Arronches serve de cenário à peça que se passa na primeira metade do século XVI. O enredo não é complicado, mas suficientemente apelativo, tendo como base um quarteto de personagens - a atraente Margarida do Telheiro, Gaspar Palhoça, o marido, Gomes Tição, o mau da história, e Simão Ventura, o carpinteiro.
Margarida e Gaspar formam um casal feliz, mas Tição, fascinado pela jovem mulher ("essa criatura põe-me o sangue em alvoroço", diz ele), engendra um ardil para raptar Margarida e vemos, num flashforward, a sua tentativa de violar a jovem mulher.
Tição aparece morto, Simão Ventura, o carpinteiro, que tinha discutido com ele na taberna, é acusado como principal suspeito. Mas Gaspar Palhoça, sentindo que está em perigo um inocente, conta como tudo se passou quando se lhe deparou a cena de tentativa de violação de sua mulher pelo Tição, a luta que se trava entre ambos, e a morte acidental deste.
Segue-se a condenação de Gaspar, o desalento do jovem, e o desespero de Margarida... O drama adensa-se...
As últimas cinco pranchas da BD, representativas das derradeiras cenas da peça, são desenhadas por Eugénio Silva com evidente sentido teatral.
Nada de espantar, se soubermos que o ilustrador de BD é também actor amador... Aliás, pormenor curioso, o intérprete Gaspar Palhoça teve por modelo um colega de teatro do autor da banda desenhada.
(*) Para ver pormenores de uma bem interessante adaptação à BD de peças de Shakespeare, basta clicar no rodapé
(**) Há mais imagens desta adaptação teatral "O Crime de Arronches", mas numa diferente rubrica, a "Álbuns de Banda Desenhada imprevisíveis e difíceis de obter", no "post" anterior.
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Postagens anteriores, que poderão ser visíveis por um simples clic no item Teatro na Banda Desenhada inscrito em rodapé nas "Etiquetas para esta mensagem"
(II) Março 27 - Shakespeare: Hamlet; Romeu e Julieta; A Tempestade - Desenhos de Gianni De Luca - Dramaturgia de Shakespeare
2006 - daqui para cima
(I) Out. 21 - O Mistério da Camioneta Fantasma - Desenhos de Pedro Massano - Dramaturgia de Helder Costa
2005 - daqui para cima
12 comentários:
Totalmente fora do contexto deste post quero pedir a sua ajuda.
Encontro-me a fazer um mestrado cuja tese será "O papel da Mulher na BD".
O que lhe peço é uma lista de BDs desenhadas por mulheres e heroínas femininas na BD mesmo que sejam desenhadas por homens, se isso não for um grande pedido. Tudo o que se lembrar será bem vindo. :)
Agradeço a sua atenção.
Lena Berardo
É um tema com bastante interesse, que já uma vez foquei num artigo numa revista ou num fanzine, não me recordo do título da revista ou do fanzine(colaborei em várias publicações de ambos os géneros dedicadas à BD).
"Se isso não for um grande pedido", diz você. Mas de facto o seu pedido é grande, como depreende no comentário que aqui deixou, e que só agora estou a ver.
Porque, para lhe dar elementos para esse seu mestrado terei de coligir elementos dispersos na minha memória, nos meus escritos e nas milhentas publicações que possuo.
Além de que o seu pedido não está muito explícito.
Por exemplo: no que concerne à lista que pretende fazer de bedês desenhadas por mulheres, não define se pretende bandas desenhadas de desenhadoras portuguesas.
Quanto a heroínas femininas da BD, presumo que dê prioridade também às desenhadas por mulheres, porque acrescenta que igualmente aceita se forem desenhadas por homens.
Esclareça-me, se faz favor.
Geraldes Lino
Por saber a dimensão do pedido que lhe fiz, escrevi o que escrevi no comentário acima.
Não quero de forma alguma criar-lhe algum embaraço porque sei o trabalho que lhe irá dar o simples facto de me indicar nomes de bds. Além do mais eu, depois, terei que encontrar forma de as "julgar" e para isso tenho que as ver, o que torna esta tarefa quase impossível.
O que peço é uma lista de heroínas da bd, quer sejam desenhadas por mulheres ou homens. Obras que refiram mulheres ilustres ou históricas estão fora de questão, porque essa é uma representação da mulher sob o ponto de vista da história e não sob o ponto de vista do desenhador.
Tudo o que é mais actual, é fácil para mim consultar. Referia-me então mais a bds do tipo "Prudence Petipas" de que decerto se lembrará. Dessa época ou ainda mais antigas... Heroínas que sejam representadas por cariz sexual também não necessito. Há muitas... :)
Manga, por exemplo, também há muita variedade e de fácil consulta.
O que pretendo mesmo são "tesouros". :)
Obrigada pela atenção e se vir que se torna numa tarefa muito árdua, não se preocupe. Apenas um nome ou dois já me ajuda muito.
:)
nismascrPERSONAGENS FEMININAS DA BANDA DESENHADA
Viva, "Joaninha vs Escaravelho", aliás Lena Berardo:
A fim de contribuir para o seu mestrado - o tal que vai ter por tese "O papel da Mulher na BD" (espero que me forneça uma cópia "a posteriori", em vistas de eu colecciono teses universitárias sobre BD e fanzines)- vou aqui fornecer-lhe uns tantos dados (não sei qual a quantidade de texto que poderei incluir num comentário, por isso, à cautela dividirei esta colaboração em partes. E para lhe facilitar o trabalho, estou a fazer uma lista por ordem cronológica.
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I PARTE
1) Bécassine
Ano de criação: 1905
Local e data em que surgiu: Revista "La Semaine de Suzette", 2 de Fevereiro de 1905
Autores: Joseph Pinchon (Émile-Joseph-Porphyre Pinchon), autor do desenho, sob argumento inicial de Jacqueline Rivière, mais tarde de Caumery.
De seu verdadeiro nome Annaick Labornez, a bretã Bécassine é uma provinciana, que trabalha como criada doméstica, de início com um comportamento tosco e num papel secundário, mas que irá evoluindo na sagacidade, até que a partir de 1913 tornar-se-á a heroína da série, ao ponto de, anos mais tarde, contribuir para a vitória dos aliados na I Grande Guerra.
Embora de características muito "sui generis", poder-se-á considerar como primeira heroína da BD, ou melhor, a primeira personagem feminina, com papel principal, da Banda Desenhada.
O seu èxito - apesar de sujeito a forte controvérsia por parte de artistas e intelectuais da Bretanha - fez com que fosse adaptada ao cinema em 1939.
2)Polly and her pals
Autor: Cliff Sterret
Com início em 1912, Polly é considerada nos EUA como sendo a primeira heroína da BD, em detrimento da francesa Bécassine.
3)Winnie Winkle
Autor: Martin Branner
Início: 1920
É também uma das primeiras heroínas da BD, representando a mulher emancipada.
4)Tillie the toiler
Criada por Russel Channing Westover, esta série surgiu nos jornais americanos em 1921.
Tillie trabalha como secretária, tem feitio independente, e que talvez devido a isso atravessa grandes complicações, mas que consegue sempre ultrapassar.
A fama da série prova-se por ter sido adaptada ao Cinema em 1927, sob título homónimo.
5) Little Orphan Annie
Início da série: 1924
Autor: Harold Gray
Annie, com o seu cão Sandy, vive duras peripécias, apesar de, na sua condição de orfã, ter sido adoptada por um industrial milionário.
6) Etta Kett
Início: 1925
Autor: Paul Robinson
Jovem de grande beleza, é uma personagem, autêntica heroína, que enfrenta os preconceitos e antecipa a revolução das adolescentes.
7) Connie
Autor: Frank Goodwin
Início: 1926
Jovem americana, loira, inicialmente apresentada como frívola, torna-se consciente e activa após a grande depressão de 1929, passa a colaborar com um jornal e até participa num golpe de Estado contra-revolucionário na URSS, numa intromissão política invulgaríssima na história da BD americana (ou, usando outra terminologia, dos "comics" americanos.
8) Blondie
Autor: Chic Young
Blondie Poopadoop, loira algo futil, acabará por casar com Dagwood Bumstead, em 1933 (a série tinha começado em 1930), e ambos protagonizarão divertidas cenas.
9) Jane
Ano de criação: 1932
Jovem "sexy", criada pelo inglês Norman Pett à imagem da célebre actriz do cinema americano, Claudette Colbert.
Esta série teve início em tiras diárias, nas páginas do jornal Daily Mirror.
Jane é considerada a primeira heroína adulta publicada num diário.
10) Arabelle la sirène
Ano de criação: 1950
Criação de Jean Ache (Jean Huet) para o jornal francês France-Soir.
Arabelle, uma sereia descoberta numa expedição marítima pelo professor americano H.G.W. Bimbleton, deseja passar a viver normalmente entre os humanos, o que consegue após uma operaçãocirúrgica que lhe proporciona ter pernas.
Errata
1) Na apresentação escrevi:
"(...) em vistas de eu colecciono", mas deveria ter escrito "em vistas de eu coleccionar".
2)Na alínea 8, dedicada a "Blondie", onde está escrito "futil" deveria estar "fútil"
Olá Geraldes!
Agradeço imenso este seu trabalho. Talvez seja mais fácil enviar por email.
lena.berardo@gmail.com
Fala em coleccionat teses de Bd. Há teses já feitas sobre BD?
Não conheço nenhuma. MAs gostava de conhecer.
Agradeço uma vez mais a sua disponibilidade.
Um bom ano novo!
Viva Joaninha vs Escaravelho
Sim, usando o tema Banda Desenhada, há já mais do que um mestrado e, quanto a doutoramento, há pelo menos um, feito por Rui Zink, que, além de professor universitário e escritor, também já fez argumentos (para os desenhadores António Jorge Gonçalves e Luís Louro).
Um dos livros dele é exactamente a edição pública da sua tese de doutoramento, tendo o livro sido editado pela Celta Editora (Apartado 151, 2781-901. Oeiras, Portugal), escrevo aqui o endereço para o caso de lhe interessar o livro, cujo título é "Literatura Gráfica? Banda Desenhada Portuguesa Contemporânea".
Nesse livro, onde nos agradecimentos consta também o meu nome, escreveu ele, logo no início: "O objecto deste trabalho (que retoma, com ligeiras correcções, a tese de doutoramento apresentada em 1998), é a banda desenhada portuguesa contemporânea, através da análise de textos exemplares. (...)
Sobre fanzines, tenho duas teses, mas não editadas, apenas em fotocópias.
Agradeço-lhe o email, aliás eu julgo que, quando nos conhecemos no Salão de BD de Viseu, lhe dei um cartão, com os endereços dos meus blogues, o meu e-mail e o meu nº de telemóvel.
Mas agora, como já comecei aqui o trabalho com aqueles curtos elementos de apoio ao seu projecto, vou acabá-lo aqui, para o texto ficar todo junto no mesmo sítio, algum dia poderei eu próprio de o consultar.
Errata:
Onde está escrito:
"(...) algum dia poderei eu próprio de o consultar",
deveria estar:
"(...) algum dia poderei eu próprio ter de o consultar"
II Parte
(continuação)
11) The Heart of Juliet Jones
Criadores: Stan Drake (desenhador), Elliot Caplin (argumentista)
Início: 1953
Série em estilo realista, destinada basicamente ao público feminino americano (mas até foi publcada em Portugal, no jornal O Primeiro de Janeiro), recheda de intrigas sentimentais, protagonizada por uma bela mulher, Juliet, com cerca de trinta anos.
12) On Stage
Autor: Leonard Starr
Data do início: 1957
Uma das poucas vezes em que uma série, tendo por personagem principal uma mulher (Mary Perkins), não tinha o seu nome no título.
Surgida no jornal Chicago Tribune, consta de uma "comic strip" de carácter realista, cuja protagonista é uma jovem provinciana que vai para Nova Iorque na esperança de vingar no mundo do espectáculo da Broadway, o que acaba por conseguir. A série terminou em 1979.
13) Octobriana
Heroína criada talvez em 1960, por um desconhecido Peter Sadecky, que conseguiu atravessar a muro de Berlim, após ter sido intérprete e ajudante de campo de um general russo.
Em que é que ele trabalhou, não se sabe. Mas sabe-se que na Grã-Bretanha, em 1971, é editado um álbum com o título "Octobriana and the Russian Underground", história protagonizada pela atraente heroína que dá título àquela que se considera a primeira banda desenhada "underground" soviética.
14) Apartment 3-G
Ano de criação: 1961
Série algo feminista, embora criada por dois autores: o desenhador Alex Kotzky e o psiquiatra e argumentista (neste caso), Nicholas Dallis.
O argumento descreve a vida de três mulheres (3-G significa exactamente "three girls") que dividem um apartamento em Nova Iorque, e que têm de enfrentar os problemas ocasionados pela vida numa grande cidade, o que faz com que seja uma invulgar banda desenhada a incluir mulheres trabalhadoras como personagens centrais.
15) Barbarella
Autor: Jean-Claude Forest
Ano de criação: 1962
Surgida na publicação intitulada "V Magazine", esta obra de notável figuração narrativa moderna foi criada por um talentoso autor francês, que escreveu o argumento e desenhou as peripécias da jovem, bonita e corajosa Barbarella, envolvendo-a em aventuras onde se mistura ficção científica e erotismo.
Graças ao êxito da série, ela acabará por ser adaptada ao cinema em 1968, com Jane Fonda na charmosa protagonista.
Muito obrigada por todas estas informações uma vez mais e votos de um Bom Ano Novo!
Joaninha
Estive nos Açores a fazer parte de um júri de BD e Ilustração, depois meteu-se o Natal, fui até ao Algarve, enfim tudo isso tem feito com que deixasse atrasar os emails, as respostas aos comentários, além de que tenho outro endereço de correio electrónico, portanto é um trabalho duplo.
Devido a tudo isso, só agora vi este seu amável voto de bom ano novo. Idem, idem, aspas, aspas.
Ainda tenciono dar-lhe mais algumas informações, embora já residuais, sobre o tema das autoras e heroínas de BD.
Abr.
GL
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