Cemitério dos Sonhos é uma obra em banda desenhada prenhe de imaginação ficcional - quiçá uma sublimação de sentimentos do escritor-argumentista - cuja leitura agarra o leitor, tal como a componente gráfica é sugestiva para o visionador.
O apreciador de BD, para além do interesse pela leitura, depara-se com pormenores estilísticos e cromáticos de elevado nível estético, como acontece com uma prancha de Rodrigo Martins dos Santos, também com uma de Cinthia Fujii (ambas acima reproduzidas), e com várias outras.
Depois da dupla André Morgado (argumentista/guionista) com Alexandre Leoni, desenhador (*), surge outro argumentista/guionista português, Miguel Peres a criar obra de BD em conjunto com quatro ilustradores brasileiros (aliás dois, e duas brasileiras), Rodrigo Martins dos Santos, Marília Feldhues, Rômulo de Oliveira e Cinthia Fujii, a realizarem obra de qualidade.
Eis o que sobressai dela:
Dre tem um emprego rotineiro, faz testes a máquinas de lavar roupa, tem de estar focado nelas, não pode deixar de fixar cada máquina durante uma hora. É entediante, e tem um efeito estranho: fora do emprego, Dre imerge-se em imagens oníricas, em sonhos que não distingue da realidade.
Este é um primeiro andamento, que classifico de capítulo para facilitar, com desenhos de Rodrigo Martins dos Santos.
"Onde estou?" "Estás dentro da tua cabeça, é normal ouvires o que pensas". Dre, no seu subconsciente, encontra o pai, e recorda cenas antigas, frases da mãe que o não entendia. "Não há estradas no mar", diz o pai, "podes velejar por onde quiseres, existe uma infinidade de caminhos que podes criar".
ENXAGUAR+CENTRIFUGAR: INICIAR.
A máquina de lavar traz Dre para a realidade.
Um segundo andamento/capítulo, desenhado por Marília Feldhues.
PROGRAMA: TERMINADO. Dre volta ao inconsciente, parece tentar romper com o passado, desprogramar a rotina. Mas há alguém que surge: a mãe, descontente com tudo. Dre questiona-a: foi ela que quis que ele nascesse, ou foi apenas por erro? Está aí uma parte dos traumas que o atormentam.
Andamento/capítulo desenvolvido por Rômulo de Oliveira.
"Acho que morri há muito tempo... Ou então só a minha cabeça funciona nesta confusão toda." Coral, personagem feminina, que o persuade a saltar de uma altura vertiginosa, existe, ou é simplesmente uma imagem criada pelo subconsciente de Dre?
Parte final, desenhada por Cinthia Fujii.
Estes quatro andamentos reflectem aspectos de uma personalidade atormentada por vivências que vêm desde a infância, e de que o protagonista Dre parece não conseguir libertar-se, mas contra as quais não desiste de lutar. Assistimos a essa luta, por vezes com aspectos insólitos, e não hesitamos em tomar partido por ele.
Para terminar, esclareço: na realidade, a obra não está separada visivelmente por capítulos, mas sente-se que Miguel Peres foi criando divisões subreptícias na trama ficcional, acentuadas pelas mudanças estilísticas de cada autor gráfico.
Imagens que ilustram o post:
Capa de Rodrigo Martins dos Santos com design da Quanta
Autores das pranchas (de cima para baixo)
1ª - Rodrigo Martins dos Santos
2ª - Marília Feldhues
3ª - Rômulo de Oliveira
4ª - Cinthia Fujii
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MIGUEL PERES
Síntese autobiobibliográfica
Em petiz lia “banha desenhada”, hoje tenta escrevê-la sem erros e muita imaginação.
Em 2011 tornou-se co-editor da antologia “Zona BD”, um projeto que aposta em jovens artistas portugueses e brasileiros.
Já trabalhou com desenhistas como Luís Figueiredo ou Miguel Mendonça (DC Comics) em histórias curtas.
Em 2012 estreou-se como argumentista com o álbum de BD “Cinzas da Revolta”, das Edições Leya, com desenhos de João Amaral.
Em 2013 foi um dos nomeados para “Melhor Argumentista do Ano” na 1ª Edição dos Prémios Profissionais de BD (Portugal).
Em 2016 criou o selo editorial “Bicho Carpinteiro” com o argumentista português André Morgado e divide o seu tempo com o trabalho de criador de conteúdos e locutor da edpON Rádio, rádio corporativa da EDP, mas está sempre irrequieto a escrever novos projetos.
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(*) http://divulgandobd.blogspot.pt/2016/10/bd-por-dupla-luso-brasileira-vida.html
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