domingo, junho 24, 2018
Primeiro álbum português de BD editado em 1872
"Apontamentos de Raphael Bordallo Pinheiro Sobre a Picaresca Viagem do Imperador do Rasilb pela Europa" é o título do primeiro álbum português de BD, editado em Lisboa em 1872.
Trata-se de uma peça histórica (embora seja apenas um fac-simile o exemplar que possuo e aqui reproduzo parcialmente) que prova o pioneirismo do artista nosso compatriota na arte sequencial, enquanto autor de banda desenhada publicada em álbum.
O presente post funciona como resposta ao texto dos estudiosos Alan e Laurel Clark, autores da obra "Comics - Uma História Ilustrada da BD" (1), onde se afirma:
"Uma data importante é o ano de 1873, quando os editores da revista Judy fizeram a reimpressão de um conjunto de episódios da série Ally Sloper editados inicialmente a partir de 1867, num só volume sob o título «Ally Sloper, a Moral Lesson», que pode considerar-se o primeiro álbum de BD do mundo."
Como se verifica por comparação de datas, a afirmação dos estudiosos ingleses é errónea. O álbum do autor português precede o inglês num ano!
Apontamentos de Raphael Bordallo Pinheiro Sobre a Picaresca Viagem do Imperador do Rasilb pela Europa
Álbum de 16 páginas, a preto e branco
Dimensões: 24x32cm
Portfólio incluindo 1ª, 2ª e 3ª edições da obra
Edição conjunta da Bedeteca de Lisboa e Câmara Municipal de Lisboa
Data da edição: [Dezembro de 1996]
Nota: Na capa do portfólio consta a indicação:
"Em comemoração do 150º aniversário do nascimento de Bordallo (1846-1905)
(1) http://divulgandobd.blogspot.com/2018/06/enciclopedia-de-banda-desenhada-post-2.html
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RAFAEL BORDALO PINHEIRO (1846-1905)
Síntese biobibliográfica
Raphael Bordallo Pinheiro - era assim que se grafava o seu nome na época -, nasceu em Lisboa a 21 de Março de 1846, filho de Manuel Maria Bordallo Pinheiro e Augusta Maria do Ó Carvalho Prostes, e foi baptizado com o nome de Raphael Augusto Prostes Bordallo Pinheiro.
Estreou-se como actor aos 14 anos, no Teatro Garrett, experiência que não teve seguimento, mas que muito o marcou.
Na sua juventude gozou, com excesso, a vida boémia de Lisboa, pelo que a sua carreira académica foi um fracasso, não por falta de se matricular em várias instituições de ensino, designadamente Academia de Belas Artes (desenho de arquitectura civil, desenho antigo e modelo vivo), Curso Superior de Letras, Escola de Arte Dramática, embora nunca tenha completado qualquer curso.
O seu primeiro emprego, conseguido por interferência de seu pai, foi num emprego público, a Câmara dos Pares, mantendo-se a seguir cursos de pintura a aguarela, e fazendo caricaturas, o que o levou a tentar ganhar a vida como artista plástico.
As suas obras iniciais intitulam-se "O Dente da Baronesa", e "O Calcanhar de Achiles", ambas dedicadas à caricatura, e no que se classifica de figuração narrativa, em "A Berlinda - Reproducções d'um Álbum Humorístico ao Correr do Lápis", todas datadas de 1870.
Estava próxima a realização da sua obra mais importante, representativa do que se pode considerar como a génese da banda desenhada portuguesa, e que data de 1872. Trata-se de um álbum, em imagens sequenciais, com o título "Apontamentos de Raphael Bordallo Pinheiro Sobre a Picaresca Viagem do Imperador de Rasilb pela Europa", uma sátira tendo por personagem central o Imperador Pedro II do Brasil.
Em 1875 publica a "Lanterna Mágica", onde irá surgir a sua personagem icónica, o Zé Povinho, com o seu popular "manguito".
Neste mesmo ano, a 19 de Agosto, partiu para o Brasil, onde colaborou em jornais e revistas, designadamente O Mosquito, Psit!!!, O Besouro.
Regressa a Portugal em Maio de 1879, onde trabalha na importante revista António Maria (1879), no "Álbum das Glórias" (1880), e no álbum de BD "No Lazareto de Lisboa" (1881).
Em 1882 e 1883 publicou-se o "Almanach do António Maria".
Em 1884 experimenta trabalhar em barro nas oficinas de Gomes de Avelar e em seguida na Fábrica de Faianças das Caldas da Rainha, onde se manteve durante vinte e um anos.
Em 1885 a revista "Pontos nos ii" substitui "O António Maria". Nesse ano homenageia os seus amigos do Grupo do Leão num painel que ficará no Café Leão de Ouro, em Lisboa, e participa com os seus irmãos Columbano e Maria Augusta na redecoração do interior do Palácio do Beau Séjour, também em Lisboa.
Em 1889 realiza a decoração do Pavilhão de Portugal na Exposição de Paris, desse ano, pelo que é agraciado com a Legião de Honra.
Devido a uma lesão no coração, morre a 23 de Janeiro de 1905, no nº 28 da Rua da Abegoaria, actual Largo Rafael Bordalo Pinheiro.
Obras consultadas:
Os Comics em Portugal. Uma História da Banda Desenhada, de António Dias de Deus
Uma Nova Forma de Estar no Humor, de Osvaldo Macedo de Sousa
Caro Geraldes Lino, os parabéns pelo blog e também pela resenha desta muito pertinente obra de Bordalo Pinheiro. Muitos parabéns!! Julgo, no entanto, que é talvez um pouco desajustado que esta sua publicação se estruture em forma de resposta a um estudo com quase trinta anos. Se, por um lado, a atribuição da paternidade da banda desenhada já fez correr muita água debaixo da ponte e actualmente se tende a "fixá-la" umas quantas décadas anteriores a 1872, por outro lado, nos últimos anos tem-se vindo a aceitar a ideia de que a própria noção de paternidade (a noção de que a banda desenhada foi inventada por alguém) é contrária a um entendimento mais justo - é bem mais interessante perceber o processo evolutivo dos códigos da banda desenhada do que tentar procurar um pai antigo à luz das definições (de BD) actuais. Saudações bedéfilas!
ResponderEliminarPedro Ferreira
Referir o fac-simile da edição em causa sem citar LEONARDO de SÁ é susceptível de processamento judicial por parte deste senhor. Espero que, implacável como é ele, não perdoe tal desconsideração...
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