sábado, maio 16, 2009

Álbuns de BD imprevisíveis e difíceis de obter (XI) - Fernando Lopes Graça. Andamentos de uma vida - Autor: Ricardo Cabrita

Edição imprevisível e improvável: assim considero o álbum intitulado Fernando Lopes-Graça. Andamentos de uma Vida, da autoria de Ricardo Cabrita, em edição da Câmara Municipal de Tomar. Trata-se daquele tipo de obras institucionais, cuja divulgação fica, naturalmente, muito restrita.
Com efeito, quantos amadores/leitores/coleccionadores de BD (estas três componentes andam habitualmente a par) terão tido conhecimento da edição deste álbum? Além dos residentes em Tomar - sejam tomarenses ou não -, assim como alguns visitantes mais atentos deste blogue (onde, a propósito da imagem do castelo de Tomar, aqui já falei do álbum, no "post" inserido no tema "Castelos na Banda Desenhada", com data do passado dia 1 de Maio), o mais que certo é de ser escassamente conhecida a obra dedicada ao categorizado músico português.
Fernando Lopes Graça nasceu em Tomar, a 17 de Dezembro de 1906, e cedo demonstrou aptidão invulgar para a música.
É o percurso pormenorizado da sua vida, enquanto compositor e intérprete musical, mas também como indivíduo preocupado com os aspectos sociais e políticos, que é transmitido ao leitor/visionador desta notável obra biográfica em figuração narrtaiva.
Ricardo Cabrita - arquitecto por profissão, autor de BD por devoção -, teve trabalho meritório nas duas componentes da realização da banda desenhada, ou seja, na pesquisa inicial de dados biográficos, recorrendo à análise de obras diversas, literárias e musicais, em livros e na Internet, e na transposição para imagens sequenciais, em registo figurativo, que descrevem em vários capítulos a vida intensa e muitas vezes atribulada, de Fernando Lopes-Graça.


Tomar. Introitus: A descoberta de "La Mer" de Debussy
A página inicial já foi mostrada aqui no blogue, no citado "post" de 1 de Maio. Note-se que essa página, bem como as duas acima reproduzidas, estão coloridas num tom sépia, comum a todo este intróito, dando uma tonalidade propícia ao flashback pretendido, como se estivéssemos a visionar retratos antigos.

Conservatório. 1º andamento: Variações sobre um tema popular português
Desde a conclusão, em 1922, do ensino secundário no Liceu Gil Vicente, passando pelo Conservatório Nacional, ambos os estabelecimentos em Lisboa - onde foram seus mestres o padre Tomás Borba e o compositor Luís de Freitas Branco -, e pelo Liceu Passos Manuel, onde ingressou no curso complementar de letras, frequenta também a Faculdade de Letras de Lisboa, todos estes estudos intercalados por recitais, um deles no Cine-Teatro de Tomar, outro no Salão do Conservatório Nacional.
Toda esta fase da vida do músico é dada, ao nível do colorido, por cores que plasmam a realidade, a reproduzir o seu dia a dia, que passa pela sua entrada para professor da cadeira de piano do Conservatório, onde ficou classificado em primeiro lugar com 18 valores.

Prisão. 2º andamento: Jornada
Pintado em tons sombrios, este capítulo descreve uma das complicações políticas na vida de Lopes-Graça (que já não eram as primeiras), passada na sede da PIDE - Polícia Internacional e de Defesa do Estado, na rua António Maria Cardoso (Chiado, Lisboa), onde é interrogado e agredido, sob diversas acusações de carácter político

Exílio. 3º andamento: La Fièvre du Temps
Após ter sido libertado, Lopes-Graça parte para Paris, onde é acolhido pelo casal amigo, os pintores Vieira da Siva e Arpad Szenes.
De notar o tratamento pictórico e técnico deste capítulo, com predominância de desenho sobre fotografia.

Resistência. 4º andamento: História Trágico-Marítima
De novo em Lisboa, Lopes-Graça passa por êxitos como compositor e maestro (de orquestra e de coros), mas também por dificuldades económicas, devido à perseguição política de que era alvo, concretizada na proibição de as suas obras serem tocadas pelas orquestras nacionais.

Raízes. 5º andamento: Canto de Amor e Morte
Totalmente concretizado graficamente a preto e branco, este quinto andamento reproduz o estado de espírito do músico. Após ter colaborado com o etnólogo e musicólogo Michel Giacometti (que, na sua recolha em gravações do cancioneiro popular português, tinha tido o apoio da Fundação Gulbenkian, mais concretamente da Comissão de Etnomusicologia do serviço de música, de que Lopes-Graça era membro), o seu trabalho foi recusado, daí que ele tenha pedido a demissão.
Mas as dificuldades que teve de enfrentar continuaram: correspondência interceptada ou, quando recebida por ele, visivelmente violada, limitação de movimentos e deslocações, enfim, vigilância constante...



Liberdade. 6º andamento: Acordai
Com poema de José Gomes Ferreira, este sexto andamento gráfico e sequencial mostra as pautas com a música do compositor, em imagens relacionadas com o 25 de Abril de 1974, trabalhado cromaticamente tal como o autor da banda desenhada tinha feito no 3º capítulo (ou, na linguagem musical adoptada, 3ºandamento), e igualmente sobre base fotográfica.


Consagração. 7º andamento: Requiem pelas vítimas do fascismo em Portugal
Nos últimos anos da sua vida, a residir na avenida da República, Parede, Lopes-Graça é visitado por uma jovem desconhecida chamada Teresa Cascudo, vinda propositadamente de Espanha para conhecer o músico, compositor e maestro, e sobre ele fazer a sua tese de doutoramento.
A situação dá azo a vários enquadramentos de grande qualidade estilística, e neles se vê o maestro a mostrar à jovem vários locais que têm a ver com ele: a Casa Verdades de Faria, no Monte Estoril, doada à Câmara Municipal de Cascais, onde veio a ser instalado o Museu da Música Portuguesa, e a Academia de Amadores de Música (Lisboa), onde iria ficar o repertório do coro daquela instituição, exactamente na associação a que foi dado o nome do maestro.
As recordações transmitidas a Teresa Cascudo passam pela afirmação de que, graças à revolução de Abril, Lopes-Graça tinha finalmente podido viver da música.
Mas estava a chegar ao fim, o que se pressente nas derradeiras imagens/vinhetas, quando diz: "Sim, estou um pouco cansado, mas ainda assim quero ver se vou rever a partitura de uma música que tenho ali em cima do piano (...) a seguir ouvir um pouco de música (...) e então, sim, descansar... a ouvir o mar, aqui tão perto, e adormecer..."
Estava em sua casa, na Parede (Cascais), onde viveu o seu último dia, a 27 de Novembro de 1994.
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Título da obra: Fernando Lopes Graça. Andamentos de uma vida
Álbum brochado, com badanas na capa e contracapa
Miolo a cores e a preto e branco, 44 páginas (32 páginas da bd, mais 12 páginas onde se inclui a pagina de rosto e elementos indicativos das fontes de pesquisa usadas pelo autor)
Autor: Ricardo Cabrita
Data da edição: 2008 (data constante da badana do álbum. O autor informou-me que foi editado em Dezembro 2008, e ofereceu-me este exemplar em Abril 2009)
Tiragem não indicada [1500 ex.]
Editor: Câmara Municipal de Tomar
Tomar
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2 comentários:

teresa disse...

e onde se pode encontrar esse album?

Geraldes Lino disse...

Há sempre que tentar a hipótese de contactar a editora, neste caso a Câmara Municipal de Tomar. E o Google sabe tudo.