Henrique Magalhães, autor de BD e estudioso brasileiro, de fanzines em particular e de banda desenhada em geral, veio a Portugal em 2015, convidado pela organização do Festival Internacional de Banda Desenhada da Amadora - AmadoraBD.
Acompanhado por Rui Brito, editor da Polvo - que acabara de lançar a sua obra em banda desenhada "Maria - Seu Nome Próprio Maria Seu Apelido Lisboa", Henrique Magalhães veio à capital participar num dos encontros da Tertúlia BD de Lisboa.
De tal maneira se entusiasmou com a ideia, que resolveu organizar uma tertúlia de BD (HQ) em João Pessoa, capital do Estado de Paraíba, no Nordeste do Brasil.
Dito e feito.
É já no próximo dia 16 de Abril, sábado, pelas 16h30,
na
Gibiteca Henfil, Espaço Cultural da Paraíba
que se realizará o 1º encontro da
Tertúlia HQ - Companheira Maria
Entrada livre.
Para registo histórico, aqui fica um link para o blogue "Marca de Fantasia" onde Henrique Magalhães dá a notícia da inauguração da sua tertúlia:
http://www.marcadefantasia.com/nasparadas/nasparadas-2016-2020/nasparadas-2016/tertuliahq-companheira-maria/tertuliahq-companheira-maria.html
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HENRIQUE MAGALHÃES
Síntese autobiobibliográfica
Nasceu na Paraíba, estado do Nordeste do Brasil, em 1957.
Em 1975 criou a personagem de história em quadrinhos Maria, que foi publicada durante vários anos em tiras diárias nos jornais locais, além de revistas e álbuns.
Atualmente dirige a editora independente Marca de Fantasia, lançando fanzines, revistas, álbuns e livros sobre História em Quadrinhos, Artes, Linguística e Cultura Pop.
São de sua autoria os livros O que é fanzine, lançado em 1993 pela editora Brasiliense, A nova onda dos fanzines (2004), A mutação radical dos fanzines (2005) e Humor em pílulas: a força criativa das tiras brasileiras (2006), pela Marca de Fantasia.
Coordena o Grupo de Pesquisa em História em Quadrinhos do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal da Paraíba, onde é professor.
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Reproduzo em seguida, com a devida vénia ao Diário Digital, a entrevista feita a Henrique Magalhães, acerca da sua obra "Maria - Seu Nome Próprio Maria de Apelido Lisboa"
Henrique Magalhães esteve no Festival da BD da Amadora, que ainda decorre, para “apresentar” a Maria aos portugueses. Esta personagem é uma das protagonistas da BD brasileira, principalmente devido a sua postura política (na ditadura militar, inclusive na atualidade), mas também por ter assumido a sua homossexualidade no passado, algo então inédito no Mundo. Portanto, conhecer a sua história é conhecer, de certo modo, a história do próprio Brasil.
Nesta entrevista, o autor revelou que Maria, em breve, poderá fazer algumas incursões em Portugal. Ou seja, é melhor conhecer em pormenor esta protagonista, já que poderá cruzar com ela nas ruas de Lisboa ou do país.
Em concreto, quem é esta Maria de apelido Lisboa? Onde nasceu? Qual a sua idade? Como definiria a sua personalidade?
Maria é brasileira e foi criada em 1975. Portanto, tem 40 anos e me acompanha desde os meus 18 anos. Comigo ela cresceu e amadureceu, embora se considere sempre aprendiz.
E como tem sido a vida dessa Maria? Tem custado “sobreviver”? É uma típica “trabalhadora” brasileira?
Ela teve uma vida intensa entre as décadas de 1970 e 1990 mas depois deu um tempo por causa das políticas editoriais dos jornais da minha cidade, João Pessoa, capital do estado da Paraíba, no Nordeste do país. Além das revistas que lancei com a personagem, a sua produção era motivada pela publicação diária na imprensa local. Com o tempo os jornais deixaram de valorizar as “tiras” e involuntariamente Maria teve um longo período de recesso, em que não me senti estimulado para a sua produção. Agora ela está em nova fase, de certo modo possibilitada pela internet, mas também pelo título «Maria Magazine», que venho editando anualmente, além dos álbuns comemorativos de suas datas redondas.
Maria já faz parte da história da BD brasileira. Poderia resumir os momentos mais marcantes da sua vida ao longo da sua vida?
Um dos grandes momentos foi a sua luta contra à ditadura militar, que vigorou no país até 1985. Maria foi muito combativa, muito crítica, bem no espírito da imprensa alternativa da época. Depois Maria se tornou mais intimista, abordando aspectos pessoais, mas também fazendo a reflexão sobre os nossos problemas sociais. Nessa fase, que vigora até hoje, Maria se tornou, de certo modo, mais universal.
Quais são as suas principais caraterísticas? O que, definitivamente, a define?
Maria é uma pessoa comum, pode representar qualquer indivíduo, seja mulher ou homem. O que a caracteriza é o seu senso crítico e bom humor, apesar de tocar quase sempre em temas graves.
Maria assumiu o seu papel de personagem principal, mas principalmente a sua homossexualidade, um marco na BD mundial. De onde veio a sua força? Quais foram os seus receios para assumir esses dois papéis?
Com o tempo acentuou-se a relação de Maria com a sua companheira, Pombinha, ao ponto de transformar-se no que pode ser considerado como “homoafetividade”, mas que no fundo não chega às vias de fato. Isso não diminui a sua postura em defesa das “minorias" discriminadas, nesse caso representadas pela homossexualidade, já que Maria sempre teve uma postura desbravadora e militante, como não por acaso tem sido também a minha.
E também não podemos ignorar o seu lado político, como referiu.
A ditadura foi-se há tempos, mas a política continua sórdida e com isso Maria não poderia deixar de meter o bedelho ao seu modo, com ironia e certo deboche a cutucar a desfaçatez do poder. A indiferença e a passividade não são, em nenhuma hipótese, traços do caráter de Maria.
E a Maria costuma viajar muito?
Maria sempre esteve comigo em minhas viagens ao exterior, mas na retaguarda, observando o ambiente. Na verdade, não é fácil para os “quadrinhos” brasileiros serem publicados até mesmo no Brasil, já que o mercado investe apenas nas obras consagradas do exterior - leia-se dos Estados Unidos. O leitor brasileiro conhece muito pouco do que se faz em quadrinhos em Portugal e em toda a Europa. O mesmo ocorre com o cinema e as séries televisivas. Isso é um problema cultural para nós autores, que também sofremos discriminação dentro do próprio país.
Maria chegou a Portugal pela generosidade do meu companheiro de ofício Rui Brito, pois também sou editor. A língua comum também foi uma vantagem, já que é muito difícil traduzir certas tiras de Maria por sua relação com a cultura e a política originais. Para a edição portuguesa algumas tiras tiveram de ser abandonadas porque podiam não fazer sentido para os portugueses. Imagine publicá-la em outra língua?... Por ter consciência disso é que procuro, sempre que possível, dar um tom universal às tiras, criticando as situações que podem ser comuns ao Brasil e a outros lugares do mundo.
Como Maria se apresenta aos portugueses? Com que “roupagem” a encontraremos no livro editado pela Polvo?
O título do álbum “Seu nome próprio… Maria! Seu apelido, Lisboa!” é uma referência óbvia e uma declaração de amor a esta terra, que tanto aprecio e que, nos últimos anos, tenho sido um visitante habitual. Maria chega com sua brasilidade, que espero seja compreendida e encante os portugueses como se fez querida no Brasil. Ainda quero fazer uma ou várias histórias de Maria em Portugal, mas isso é um projeto a maturar. Quem sabe, para quando eu e ela estivermos morando aqui.
Como foi escolher as suas “memórias” para esta edição da Polvo? O que ela teve em atenção?
Escolhi as tiras mais representativas da década de 1990 e principalmente a fase mais atual, de 2010 a 2014. São tiras que mostram o quanto Maria pode ser crítica e também lúdica, já que brinca constantemente com as situações cotidianas.
Podemos considerar Maria de apelido Lisboa um alter-ego de Henrique Magalhães?
Sim, sem dúvida! Maria tem sido tema de uma pesquisa de pós-Doutorado na Universidade de São Paulo, realizada pela professora Regina Behar, da mesma Universidade Federal da Paraíba onde eu ensino. Esse estudo, que gerou um vídeo documentário e em breve será editado em livro pela editora Marca de Fantasia, tem por título “Eu sou Maria!”, numa completa anuência do quanto criador e criatura se completam.
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