Logótipo do programa Ver BD (VERBD), transmitido na RTP2
http://www.youtube.com/watch?v=QuoXtkta8O8
Inegavelmente, tratou-se de iniciativa sem precedentes na área da televisão portuguesa, o programa VerBD, transmitido pela RTP2 ao longo de cinco domingos, entre 29 de Julho e 26 de Agosto.
Mesmo tendo a noção da restrita audiência que caracteriza o segundo canal da televisão estatal, por se direccionar a uma faixa de público com mais exigências culturais, portanto minoritária, não será exagerado considerar que as cinco partes constitutivas do VerBD - transmitidas cerca das 13h dominicais, e em repetição à noite, a rondar a uma hora da madrugada - terá tido alguns milhares de espectadores, o que se poderá considerar como significativa ressonância pública. Logo, terá sido atingido o possível objectivo dos responsáveis do programa - Pedro Vieira Moura, no papel de entrevistador, e Paulo Seabra, realizador, ambos com trabalho meritório no VerBD, nessas áreas -, que se presume tenha sido o de dar a conhecer algo da Banda Desenhada em Portugal, passado e presente.
O relativo êxito que terá sido supostamente obtido - julgo não haver ainda feedback - pelo programa, não impede que se discorde do critério adoptado pelo seu idealizador, o crítico e bloguista Pedro Vieira Moura, no que concerne à escolha de personalidades do pequeno universo da BD portuguesa para serem entrevistadas.
Embora seja do senso comum a noção de subjectividade que isso envolve, e que reconheço, mas que não impede que, por meu turno, defenda diferente ponto de vista, igualmente subjectivo, admito.
Para quem não viu a totalidade dos cinco programas, ou episódios – ou até para os que, por qualquer motivo, não viram nenhum – vou nomear, pela ordem casual dos meus apontamentos, as individualidades que foram vistas e ouvidas, entre autores, estudiosos, críticos, divulgadores e orientadores de cursos.
Autores: Filipe Abranches, Isabel Carvalho, Pedro Nora, Diniz Conefrey, José Carlos Fernandes, António Jorge Gonçalves, Luís Henriques, André Lemos, Susa Monteiro, Miguel Rocha, David Soares..
Estudiosos, críticos, divulgadores, orientadores/formadores de cursos de BD:
João Paulo Cotrim, António Dias de Deus, Leonardo De Sá, João Paulo Paiva Boléo, José Pedro Cavalheiro-Zepe (professor de BD e Ilustração, também autor de BD), Domingos Isabelinho, João Miguel Lameiras, Geraldes Lino, Marcos Farrajota e Jorge Nesbitt, este último não na condição de crítico ou afim, mas por ser responsável dos cursos de BD e Ilustração do AR.CO - Centro de Arte e Comunicação Visual, e o escritor Diniz Machado, por ter sido director da marcante revista Tintin.
Dirá no fim do ciclo de cinco episódios, Pedro Moura, em "voz off" (logo, sem nunca ser visto, demonstrando louvável modéstia), ao jeito de justificação das ausências: "Gostaríamos de ter mostrado outros autores (…)".
Ora isso teria sido perfeitamente possível com diferente critério, isto é, se não tivessem sido ouvidos, duas e três vezes, em questões diferentes, sempre os mesmos autores, os tais onze referidos no programa, havendo entre eles quem apenas tenha escassíssimas bedês publicadas, portanto nitidamente privilegiados nesse aspecto, em detrimento de muitos outros que ficaram de fora, com obra de maior volume (sem faltar qualidade) e de que aponto apenas os nomes dos que têm tido actividade recente, mesmo que descontínua: Pedro Massano, Zé Paulo, Arlindo Fagundes, José Pires, José Garcês, José Ruy, Santos Costa, Artur Correia, Baptista Mendes e Eugénio Silva, entre os veteranos de prestígio, neles incluindo Jorge Magalhães, que assim seria um argumentista presente, ainda que único (Cotrim também o é, mas não falou nessa qualidade). E, de gerações posteriores, Nuno Saraiva (gritante e inexplicável a sua ausência, quer como talentoso e prolífico autor, quer como fundador do curso de BD no AR.CO e nele professor), Pedro Burgos, Luís Louro, João Amaral, João Fazenda, Rui Lacas, Ricardo Ferrand, Pepedelrey, J.Coelho, Rui Gamito, Estrompa, Horácio, Pedro Morais, J.Mascarenhas, José Lopes, Jorge Mateus, Daniel Lima, Algarvio, Pedro Nogueira, Ricardo Cabral, Miguel Montenegro, Daniel Maia, Eliseu Gouveia-Zeu, além de Álvaro, Rui Ricardo, Pedro Alves, Carlos Rico e Luís Pinto-Coelho, estes últimos cinco inseridos na área da BD humorística e/ou caricatural, sempre injustamente depreciada e ostracizada, e José Abrantes na BD infantil, outro género menosprezado. Mas também imprescindível, em entrevista viável pela internet, Fernando Relvas, um muito importante autor português a residir na Croácia. Entretanto, na área das autoras, apenas houve lugar para duas, Isabel Carvalho e Susa Monteiro, tendo ficado de fora várias outras, concretamente Teresa Câmara Pestana, Alice Geirinhas, Ana Cortesão, Ana Freitas, A.Rechena e Joana Figueiredo-Júcifer.
Pode parecer uma galeria demasiado extensa. Mas, repito, ao longo de cinco episódios houve convidados, entre autores e comentadores, que falaram várias vezes, e, em especial no último,
em que voltaram a ser vistos e ouvidos quase todos os intervenientes. Em vez disso, bem poderia ter sido aproveitado esse derradeiro tempo para mostrar breve imagem do rosto e uma simples vinheta de cada um dos autores-artistas da lista que enunciei. Porque, da forma como foi apresentado o programa, os telespectadores não especialistas poderão ter ficado com a noção errónea de que aqueles onze autores são os únicos a trabalhar, ou os mais importantes na BD portuguesa actual. A galeria (forçosamente incompleta) que apresentei daria imagem mais abrangente, e bem mais justa. Isto porque todos os que citei têm andado a encher, grão a grão, o acervo da actual BD lusa, bem mais volumosa do que pensa muita gente pouco atenta ao que se edita à sua volta, em jornais, nas revistas não especializadas em BD, em álbuns comerciais e institucionais, na internet e nos fanzines.
Na área da crítica e ensaísmo, há pelo menos três estranhas omissões: João Ramalho Santos, autor de textos com notável qualidade e evidentes conhecimentos sobre BD nacional e estrangeira na extinta revista Ler, e presentemente no quinzenário JL-Jornal de Letras Artes e Ideias, o jornalista Carlos Pessoa, autor de vários livros da especialidade, entre outros aqueles onde foram recolhidos os seus numerosos textos sobre heróis da BD publicados no jornal diário Público, Pedro Cleto, que semanalmente assina a rubrica "Aos Quadradinhos" no Jornal de Notícias, e tem escrito frequentes artigos de análise no BD Jornal, e Sara Figueiredo Costa, com interessantes críticas no seu blogue Beco das Imagens e na revista mensal Os Meus Livros. Por outro lado, é bem compreensível que o entrevistador e responsável literário do programa não se tenha incluído neste lote, ele que escreve com lucidez e elevado nível estilístico no seu blogue Ler BD.
Disse mais Pedro Vieira Moura, à laia de justificação, no programa de despedida:
"(…) Há porventura outras perspectivas. Esta foi a nossa.".
É óbvio que assim teria de ser. Só que a selecção de convidados para o programa (e sou insuspeito nesta crítica, visto que também lá consto) aparenta demasiado tratar-se de um círculo fechado, onde, para agravar, há autores que, fora do programa, se costumam assumir mais da área da ilustração do que da banda desenhada.
Mas que fique bem claro: não obstante a componente algo controversa que acabo de focar, há que reconhecer a qualidade global do programa, com excepcionais enquadramentos e pormenores visuais de elevado nível – ambas as facetas por mérito do realizador, Paulo Seabra – e a oportunidade e invulgaridade da iniciativa, bem como algumas ideias brilhantes, a crédito de Moura. Em especial, a que se infere da frase sempre presente no início das transmissões: "Aviso ao telespectador: Não há sincronização entre o som e a imagem nos próximos 24 minutos", o que tinha o mérito de permitir observar o entrevistado em pormenores dinâmicos ou meditativos, enquanto se ia ouvindo a sua fala com nitidez e sem interrupções, por ser gravação. Excelente resultado obtido.
Ainda de relevar, com aplauso, a útil iniciativa da abertura do blogue homónimo, no endereço http://programaverbd.blogspot.com/
que permitia visionar o alinhamento do programa seguinte.
Depois destes indiscutivelmente valiosos, apesar das minhas reticências, cinco programas vezes vinte e cinco minutos – um espaço e um tempo nunca antes conseguidos para a nossa figuração narrativa –, esperemos que haja uma próxima jornada, um VerBD II correspondente a um segundo volume da banda desenhada portuguesa, abarcando então os autores em actividade, agora excluídos.
Assim se fará justa divulgação pública de tantos não contemplados neste primeiro VerBD, apesar de terem obra digna, embora mais em registo mainstream, género aparentemente maldito em alguns círculos elitistas, e quase banido em absoluto deste programa, em favor da bd alternativa cultivada pela maioria dos onze autores ora seleccionados.
Geraldes Lino
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Há um "post" anterior sobre este mesmo tema, com data de Jul.28, 2007. Para o visitar, basta clicar nesta data na coluna "Archives"
24 comentários:
Gostei principalmente do programa sobre fanzines, o 4º acho eu, pela variedade e quantidade de BDs que foram mostradas, o que contrastou com os anteriores. Acho que se abusou um pouco do primeiros planos dos globos oculares e orelhas dos intervenientes em detrimento de obras que poderia ter sido mostradas.
O elitismo aqui bastante patente também me parece negativo.
Não sei o que que se ganha em tentar impingir a BD portuguesa como uma "Arte". Encher uns egos? Por quantos dias?
Como disse Zepe a BD é uma coisa rasca e é isso que tem piada. Podemos fazer tudo o que nos passar pela cabeça e chegar a toda a gente. Uns chegarão a uns e outros chegarão a outros. Há espaço para todos. Se não houver em papel arranja-se na Internet.
Há outro problema bastante relevante na generalidade da BD Portuguesa (na elitista e na outra) que não foi focado. Os argumentos. A BD, tal como o Cinema e os Romances, conta histórias. Penso que ainda é assim em qualquer país para lá da fronteira portuguesa a avaliar pelo que compro importado.
Para além do desenho o argumento tem um papel crucial em cativar o leitor. Um mau ou inexistente argumento lixa tudo. Estraga uma história que poderia ser interessante e acaba por empastelar o trabalho do desenhador que não acredita no que está a fazer.
Gostaria que esta grave deficiência na BD portuguesa que afugenta o público tivesse sido abordada.
Obrigado Álvaro pelo teu comentário, que deu valiosa achega ao que escrevi. No que se refere ao teu último ponto focado, o argumento, julgo que reparaste que também apontei para a falha de não ter sido convidado ao menos um argumentista, o veterano e conceituado Jorge Magalhães.
Estou perfeitamente de acordo com os comentários do Lino e do Álvaro. Foi pena que em cinco programas não se ouvisse falar de nomes tão importantes na BD portuguesa como José Ruy, José Garcês, Artur Correia ou Jorge Magalhães, só para citar alguns, claro. E creio que Isabel Lobinho - outro nome incontornável - também não foi referida.
Ninguém duvida da qualidade dos 11 autores presentes no programa mas a escolha é, de facto, muitíssimo discutível. Como muito bem diz o Lino: uns são mais ilustradores do que banda desenhistas e outros não têm um único álbum publicado!
Faz lembrar (bastante) a célebre escolha de autores nacionais para representar Portugal em Angouleme, nos anos 90...
No meio de tudo isto, valeu-nos o facto de não se ter falado em festivais caso contrário teríamos levado com o FIBDA durante um programa inteiro e o resto seria paisagem...
Mas enfim, nem tudo foi mau. Há que dar os parabéns à equipa que realizou o programa que, inegavelmente, tinha qualidade e desejar que, numa próxima vez, corrijam estes aspectos.
Nada se move de novo sob o Sol, caro Lino!
Cinco programas é curto para espalhar a tenda de todos os argumentistas e desenhadores de BD portugueses; mas cinco programas é suficiente para traçar, num único sequer, um mais vasto panorama desse extenso lençol onde estão, mais que os nomes, os trabalhos dos autores portugueses actuais.
A BD tem destas coisas: conhece-se e fala-se de quem bate nas costas e se senta às mesas dos cafés com editores, mentores, realizadores, produtores e outros "ores" - em Lisboa principalmente - e esquecem-se os que, noite e dia, suam nas mesas de trabalho e estiradores (mais ores).
Pudera! Quem trabalha não faz relações públicas.
Sabes tão bem como eu que, para esquecido, nem sequer num dicionário da BD consto (!); e, no entanto, tenho dezenas de trabalhos publicados em diversos formatos e meios.
De todos os "olvidados", sangra a omissão do nome do Jorge Magalhães e do Augusto Trigo (que também omitiste), mas eles deixaram obra suficiente para que sejam recordados por quem ama e gosta realmente de banda desenhada.
Um abraço amigo do
Santos Costa
Saiu o meu comentário como "anónimo", por lapso na identificação. Abomino essa "assinatura" - anónimo.
Daí corrigir a falta, identificando-me neste sequente comentário, muito embora tenha assinado a "carta" anterior.
Mais um abraço
Santos Costa
Não deixa de ser paradoxal que o alternativo tenha toda a atenção, enquanto o 'mainstream' é que é marginalizado. É a irónica natureza da banda desenhada, essa estranha coisa a que chamam "nona arte". :)
Só para notar que o Pedro Moura ESTÁ (omni)presente enquanto crítico, na medida em que escolheu todos os participantes e planeou o programa... Não precisa de intervir directamente como entrevistado para deixar a sua marca a este nível, pelo contrário.
De resto, conhecendo-se o seu trabalho e interesses a esse nível, a escolha dificilmente poderia ser outra. Com outras escolhas seria outro programa, com outro tipo de intenções e visão, que (muito provavelmente) não interessaria ao autor fazer. Quem quiser (e puder...) que o faça.
São os critérios deste programa e deste autor, e aos quais, nessa perspectiva, rigorosamente nada há a apontar.
Apesar da escolha de autores ser discutivel e serem obviamente reflexo da visão que o autor do programa tem acerca da BD, penso que o principal problema nao é propriamente os autores em si mas o trabalho especifico que estes apresentam.
Ou seja, esperava ver uma maior variedade de técnicas, mostrando assim o verdadeiro potencial da Banda Desenhada. A ideia que passaram da BD como técnica foi demasiado limitada a meu ver. A importancia das novas técnologias deveria ser realçada (e não apenas as mais clássicas), bem como as diferentes abordagens que a BD pode assumir. Eu teria escolhido os autores com esse critério.
Sobre a falta de argumentistas, já foi aqui falado (embora tenhamos que admitir que estavam lá presentes argumentistas, mas na condiçao de argumentista/artista).
De qualquer forma, gostei bastante do programa. O conceito "gráfico/audiovisual" tornou-o atractivo e apelativo, mostrando um produto original. Gostei de ouvir a opinião critica de várias personalidades, procurando mostrar que Banda Desenhada é uma arte que existe em Portugal.
Um ponto a realçar, os autores dizem que o programa apenas mostrou uma abordagem da BD nacional, muito mais haveria para dizer, eles apenas apresentaram a sua visão. E penso que isto justifica, de certa forma, grande parte do que eu possa nao ter apreciado (e nao só).
Por fim, teve alguns aspectos que me agradaram mais e outros que agradaram menos mas no fundo devo dizer que adorei o programa. Soube foi a pouco, gostaria que houvesse mais episódios.
Confrontam-se aqui, claramente, dois pontos de vista, não necessariamente antagónicos, mas diferentes. O de Geraldes Lino, divulgador (não é por acaso que este blog se chama Divulgando Banda Desenhada), para quem tudo nesta arte merece os seus quinze minutos de fama, pelo menos (Tom Spurgeon chamou a esta atitude: "Team Comics"). O de Pedro Moura, crítico, com as suas escolhas... Como muito bem disse João Ramalho antes de mim: "São os critérios deste programa e deste autor, e aos quais, nessa perspectiva, rigorosamente nada há a apontar".
Portanto...
O trabalho, as escolhas e os critérios do crítico não podem ser criticados?
He, he... Bem visto, Álvaro! Mais uma incongruência. Acho que as pessoas não têm de ver uma crítica (principalmente se é construtiva, como é o caso desta do Geraldes Lino) como um ataque. Estamos habituados a ver uma atitude crítica como sendo motivada pela inveja, antes mesmo de analisada a sua pertinência. Eu adorei o programa VerBD. Como disse ali o Gevan, a série foi óptima e soube a pouco. Se calhar, valia a pena retomar a série no futuro, abordando outras vertentes da BD...
Aliás, e se estamos a discutir o programa, só mostra que ele teve importancia para nós e ficámos interessados nele.
Seria bem pior se ele nem fosse mencionado ou se nem tivesse qualquer critica. Significava que ninguém o tinha visto.
Olá, Geraldes Lino, e a todos os leitores,
Fico grato de o programa ter levado a algum grau de discussão, e num espaço gerido por alguém que muito prezo e que sei ser um nome importante no panorama da banda desenhada portuguesa, como o Geraldes Lino, que conto entre as amizades no “meio”. Gostava de ter a oportunidade de tentar responder a alguns dos pontos apresentados, se bem que não possa ser exaustivo em todos eles. Tentarei também por aqui responder ao texto que o João Miguel Lameiras nos dedicou nas páginas do Diário das Beiras, incluído no blog do programa, e que aponta muitos aspectos críticos igualmente pertinentes.
O que primeiro gostava de deixar claro é que assumo totalmente as responsabilidades que me cabem em relação ao programa VERBD, que partilho de modo igual com o Paulo Seabra. A equipa de produção e as decisões estilísticas e intelectuais que pautaram o programa pertencem-nos completa e exclusivamente (ainda que se deva esclarecer o apoio quer da parte da produtora Black Maria e da própria RTP, naturalmente), assim como as suas limitações, erros ou falhas que os espectadores considerem existir. Todavia, sendo um programa de televisão, produzido para um canal público, para um formato muito específico (cinco programas de 25 minutos cada), a estruturação da potencialidade foi feita no interior de um pequeno espartilho: esse espartilho jamais se tornou fonte de restrições ou constrangimentos, mas simplesmente o espaço no qual poderíamos exercer a nossa total liberdade, que afirmo ter sido cumprida.
Em segundo lugar, como várias vezes deixei claro e foi mesmo afirmado no programa, no blog e noutros espaços, o VERBD nunca almejou tornar-se um programa exaustivo sobre a banda desenhada portuguesa. Tratava-se tão-somente de criar um panorama, sobretudo da contemporaneidade da banda desenhada portuguesa, e para a criação desse panorama criou-se um prisma que serviria de ponto de partida para a emergência do discurso pretendido. Esse prisma consolidar-se-ia pelos autores. Não poderíamos, nunca, falar de todos. Uma escolha era, portanto, imperativa. Como os escolher? Como fazer uma escolha que – não esgotando nada, não se querendo tornar holística ou última - se pudesse considerar, mesmo que por este ou aquele sector, pertinente para se falar da banda desenhada contemporânea portuguesa?
Há duas respostas que devo avançar neste momento, e que não têm ordem de importância. Em primeiro lugar, Geraldes Lino sabe como poucos que, pessoalmente, conheço muitos autores de banda desenhada, de vários “sectores” (como muitas pessoas querem ver e entender que funciona este mundo pequeno e compacto) e que não me pautei por esse critério de laços de amizade. Não nego, porém, que nutro amizade por alguns dos autores presentes no VERBD, não é segredo nenhum. No entanto, parecendo-me que alguns dos comentários apontam nesse sentido, digo que não poderiam ser mais erróneos.
Por outro lado, e aproveitando as palavras de Domingos Isabelinho, o meu objectivo não é o de divulgar a banda desenhada, mas o de construir um discurso crítico muito específico. Como todos os que escrevem sobre banda desenhada ou lêem sobre ela em Portugal sabem, cheguei à relativamente pouco tempo a esta área de discussão pública, em contraste com as pessoas que passaram pelo “Nemo”, pelas edições portuenses da “Quadrado”, das várias revistas, boletins e dossiers existentes. Há pessoas com muito mais experiência e conhecimento do que eu para a divulgar, com uma capacidade de escrever textos cristalinos e capazes de explicitar a razão pela qual uma ou outra banda desenhada merece ser conhecida por um grande público. Outros há, e são a fonte da minha influência, que conduzem por um caminho de verdadeira discussão, que erigem os possíveis meios de análise e crítica da banda desenhada, secundarizando a opinião pessoal e os gostos da maioria, critérios nulos de qualidade. A minha intenção é diferente. Pode ser considerada de muitas formas, “académica”, “elitista”, até mesmo “chata”, mas como todos os restantes construtores de discursos, não desejo impô-lo, apenas discuti-lo.
Logo, tendo em conta esses dois aspectos – não ter sido conduzido por meros elos de amizade e pretender criar um discurso sobre a banda desenhada balizado por uma discussão intelectual consolidada – lancei-me na selecção de alguns autores que me pareciam desenhar um panorama interessante. Alguns critérios foram taxativos: autores que estivessem “no activo”, pondo de lado autores que tenham abandonado a “cena”. Assim, com pena pessoal uma autora como a Ana Cortesão, que prezo acima de tantos outros, ficou “de fora”. Mas por outro lado, devo dizer neste passo que não considero nem a Ana Cortesão nem a Isabel Carvalho nem a Susa Monteiro “autoras de banda desenhada”, como o Lino o aponta, diferenciando-a dos autores homens. Considero-as, a estas, a outras mulheres, e a todos os homens, da mesma forma: autores de banda desenhada. Outros critérios positivos ditaram as sortes. Por exemplo, um dos anónimos indicou que alguns destes autores não tem sequer um álbum publicado... Das duas uma: ou apenas a Susa Monteiro cai nesta “categoria”, ou então entenderei “álbum” como um formato específico herdeiro da tradição dita franco-belga e reduzo a possibilidade de escolha. Se o autor dessas linhas não conhece o trabalho em formato de livros de todos os autores, não é minha responsabilidade. Seja como for, esse também não era um critério. Há autores que nunca fizeram livros e são gigantes da banda desenhada. Apenas um único exemplo: Winsor McKay. A feitura de uma banda desenhada para um formato em livro não é critério nenhum. Ainda gostaríamos de ter perspectivas muito diferentes, o que nos levou a incluir autores mais velhos e com mais experiência, como o Diniz Conefrey, o António Jorge Gonçalves e o Filipe Abranches, a outros mais velhos mas mais recentes, como o José Carlos Fernandes, a outros mais jovens e com trabalhos consolidados, como o David Soares, o Miguel Rocha e o Pedro Nora, uma jovem e um menos jovem recém-chegados à cena, como a Susa Monteiro e o Luís Henriques, e dois autores que já trabalham à algum tempo, têm muita obra publicada um pouco por todo o mundo, mas são estrelas somente em círculos mais restritos, como a Isabel Carvalho e o André Lemos. Como repetidamente afirmei ainda, os critérios jamais foram por exclusão (“este não entra”) mas sim por inclusão e construção de pertinência. O que levou a que determinados autores, excelentes, não entrassem por terem a sua “categoria” já representada, na minha/nossa perspectiva, ocupada pertinentemente.
Por outro lado, pretendíamos criar um panorama a partir da perspectiva de um grupo restrito de autores, lançando à discussão vários temas que fossem considerados, debatidos e pensados por estes autores, e não dar voz a todos (como se isso fosse possível) os autores vivos da banda desenhada portuguesa. O mesmo dirá respeito aos outros intervenientes, com todo o respeito para todos eles. Por exemplo, houve convites que foram feitos mas não puderam ser cumpridos por razões pessoais, houve mesmo entrevistas feitas mas não utilizadas (por razões que se prendem precisamente com limitações de tempo e repetição de discursos). O programa era sobre autores, e não pretendia de modo algum fazer um panorama de todos aqueles que escrevem sobre banda desenhada. Indique-se ainda que o papel da Sara Figueiredo Costa foi bastante activo, ainda que em termos de bastidores. Gostava de deixar aqui esta nota, publicamente. Mas também aqui houve uma selecção, imperativa para a clareza dos discursos que foram feitos.
A proliferação de discursos – através da inclusão de mais autores e possíveis interlocutores - levaria à sua mesma desagregação. As entrevistas a cada autor, por exemplo, levaram a conversas de cerca de uma hora e meia em média. Repare-se, todavia, o “tempo de antena” reservado a cada um desses autores nos programas apresentados. Logo, a multiplicação de intervenientes não é, à partida e sob a fórmula que seguimos, uma boa ideia.
Ainda assim, devo dizer algo mais.
No entanto, há alguma desatenção de alguns dos comentários neste post em relação ao programa, quer do seu instigador quer da parte de alguns respondentes. Talvez pelo estilo do programa arriscar na multiplicação de canais de informação (imagem, som, texto escrito), ou a particularidade da dessincronização (que não têm qualquer problema intrínseco a não ser o gorar as expectativas da ilusão naturalista dos programas de televisão), parece-me que as pessoas não notaram na presença de muitos dos artistas que dizem ter estado ausentes... sob a forma de imagens (sempre com a atribuição dos nomes, salvo um erro apontado no blog) ou de citações, surgem quase todos os nomes citados nos comentários a este post. Por exemplo, a Isabel Lobinho é mesmo reservado um espaço privilegiado (três pranchas) aquando da discussão da revista Visão. Três pranchas, pode parecer que não, mas em televisão, é muito, tendo em consideração o edifício erguido.
Aliás, os dois primeiros episódios tentaram criar uma perspectiva histórica, desde o século XIX até à revista LX Comics, que me parece ter dado entrada a um fazer contemporâneo de banda desenhada em Portugal, que ainda hoje continua. E só alguns autores (cinco, dos onze) acabam por falar das revistas Tintin, Visão e Lx Comics. Os dois seguintes episódios são exclusivamente dedicados aos autores, é certo, mas vogando por territórios tão pessoais (técnicas, obras publicadas) como gerais (perspectivas sociais, partilhas de memória, etc.). E terminámos com um episódio quase totalmente ocupado por quatro ideias sobre o ensino (com os seus directores ou responsáveis maiores, logo não faria sentido multiplicar a sua presença com os restantes professores) e com o nosso discurso de balanço final... Logo, dizer que os autores tiveram uma presença demasiada é, parece-me, erróneo.
Que existem outros autores, e de qualidades indiscutíveis, não é novidade. Mas a exaustão, repito-o, não é um caminho correcto para a assunção de um discurso que se pretende coeso e pertinente sobre a banda desenhada. Como muito bem entendeu João Ramalho Santos, a minha presença e a do Paulo Seabra (por favor, não se esqueçam que este foi um trabalho a dois, de responsabilidades assumidas em conjunto) são sentidas pela própria substância do programa.
Mas há um outro aspecto que desejo tornar claro, se bem que seja sempre impossível esgotar toda a fundamentação desta perspectiva. É que o nosso objectivo não era criar um panorama completo da banda desenhada portuguesa contemporânea, mas muito menos da banda desenhada enquanto objecto de paixões cegas e acriteriosas, mergulhando-se em obras que possam ser muito famosas, conhecidas mas que, a meu ver, são fracas em termos da linguagem, potencialidade e valor da banda desenhada enquanto modo de expressão. Os critérios foram de inclusão, mas algum grau de subjectividade não é de menosprezar (afinal, é dado adquirido do espírito humano) e uma dessas subjectividades é aquilo que entendemos ser a qualidade. A qualidade tem a ver com um determinado fazer, que se pretende adulto, correspondendo ao mundo real, às preocupações sociais do presente, às possibilidades expressivas que o ser humano possui, à capacidade de reinvenção ou alguma proximidade a uma voz autêntica, genuína, pessoal. Assim sendo, não será surpresa que alguns trabalhos derivativos e de banda desenhada comercial, de género, tenha sido preterida em nome de todos estes autores capazes de uma voz pessoal. Algures, alguém indicou que não se tinha dado atenção nenhuma aos mangakas portugueses – autores de mangá portugueses. Pois bem, julgo que a razão disso reside precisamente nessa mesma distinção. São autores de uma banda desenhada cuja tradição não nos pertence, cujas regras de construção são ligeiramente diferentes da banda desenhada europeia e ocidental em geral. Este é um ponto fraco de argumentação, eu sei, pois são autores portugueses a fazer bandas desenhadas em português e em Portugal. Logo, qual a diferença? Mas acima de tudo porque não existe nenhum mangaka português ou portuguesa, pelo menos que eu conheça, capazes de criar uma obra que lhes seja própria, pessoal, não-derivativa. E não se apressem a indicar que é isto devido a um preconceito meu, pessoal, contra a banda desenhada japonesa ou “à japonês”... Passeiem-se um pouco pelo LERBD e verão que tal preconceito pura e simplesmente não existe. Aliás, nenhum preconceito existe nas minhas leituras de bandas desenhadas. Só existem conceitos após a leitura, e a falta de qualidade só é avaliada após a leitura. A razão que me levou à exclusão dos mangakas é a mesma que me levou a não ter dedicado mais tempo a autores como Miguel Montenegro, Eliseu Gouveia, João Lemos, Ricardo Tércio e Daniel Maia... Estou desejoso de ver o livro do João Lemos e gostei muito do traço do Tércio no Spiderman Fairy Tales mas que eu saiba o Homem-Aranha não é candidato à inclusão na “banda desenhada portuguesa”. Possa vir eu a fazer um documentário sobre “autores portugueses a trabalhar para mercados internacionais” e serão eles os nomes centrais!
O desequilíbrio para com os argumentistas é mais pertinente. Saberão alguns que não sigo o mito do “autor completo”, mas por uma questão de clareza, mais uma vez, foram seleccionados antes autores que fossem capazes que criar as suas obras sozinhos (apesar de todos eles terem já trabalhado em colaborações), e sendo a porção visual a mais, perdoe-se o pleonasmo, visível, foi essa a perseguida. Tal como o LERBD se dedica à dimensão do legível e do interpretável, prestando-se a ser um espaço de um discurso mais alongado e de todo o tipo de associações suscitado pela leitura concreta, o VERBD é um espaço de um modo visual debruçando-se sobre outro modo visual... Deseja-se enquanto ponto de equilíbrio entre um instrumento de pedagogia mas também de reflexão, de retrato mas também de crítica.
Por ocasião do 17º Festival da Amadora, em 2006, fui um dos convidados, juntamente com a Sara Figueiredo Costa, a darmos algumas achegas para a exposição dos “17 portugueses”. Também aí se reservou um espaço externo e futuro para os argumentistas, e apresentámos uma lista de cerca de 20 nomes que julgamos pertinente, 20 nomes de pessoas que escrevem mas não desenham banda desenhada. 20 nomes contra os 2 que existiam originalmente. Espero que se venha a concretizar essa ideia, a efectuar essa exposição. Mas num programa de televisão não havia tempo para explorar as histórias em particular. Não o fizemos, com pesar, sobre estes onze autores. Não o fizemos dos brilhantes e bravos argumentistas existentes em Portugal (alguns deles surgiram no programa, mas não nessa qualidade, como bem apontou Geraldes Lino).
No catálogo da Amadora, a propósito dessa exposição citada, a Sara e eu delineámos esta frase: “uma escolha é uma escolha é uma escolha” (imitando Gertrude Stein). De facto, repita-se, até à exaustão: esta foi a nossa escolha, a nossa selecção, a nossa perspectiva. Debater esta escolha com outra escolha é um exercício ligeiramente desprovido de sentido, a não ser apenas uma forma de mostrarmos a nossa capacidade, quando não fomos nós a fazer essa escolha, de a fazer. Todavia, é muito saudável e desejável que esta escolha, ou mais profundamente, que as consequências desta escolha e o discurso que foi possível construir com ela sejam alvo de apreciação crítica, análise, discussão e até mesmo contestação, para que se possa, cada vez mais, construir um discurso verdadeiramente democrático, equilibrado e adulto sobre a banda desenhada.
Aliás, é mesmo nosso desejo que se sigam novas aventuras, investigações e projectos... Porque pensam que terminámos o programa com “Venham Mais Cinco”?
Vosso,
Pedro Moura
P.S.
esta resposta surgirá como entrada num post no blog do VERBD
Depois do texto acima esta resposta à pergunta que me foi feita vai ser inevitavelmente redundante e desnecessária, mas enfim...
Tudo se pode discutir e criticar. Sou um grande adepto da metacrítica quando esta é, por assim dizer (e perdoe-se-me o neologismo, não por neo, mas por palavrão), macrometacrítica. Ou seja, quando se tratam questões verdadeiramente de fundo relacionadas com um panorama geral. Esmiuçar as particularidades estéticas de um objecto crítico em particular é criticar o crítico não como crítico, mas como artista (o que ele também é, claro... mas essa é uma metacrítica que nem o chega a ser; é um remate ao lado da baliza). Por outro lado, debater inclusões e exclusões (sempre) subjectivas e finitas significa apenas que o metacrítico tem outros objectivos e outros critérios. Essa constatação parece-me demasiado óbvia para ser produtiva.
PS Só me fica uma pequena dúvida, mas prefiro achar que ela não tem nenhuma razão de ser: suponho que ninguém pretende silenciar as escolhas de ninguém?...
Tal como o Isabelinho, acho que ficou tudo dito, mas, para evitar falácias...
TUDO se pode criticar, como é óbvio. A questão é que lendo regularmente o LerBD (peço desculpa por não conhecer o trabalho do Paulo Seabra) era impossível não adivinhar como o programa ia ser ou o que o Pedro Moura veio dizer aqui. O programa é dele(s), tem liberdade para o fazer. É nessa perspectiva que nada há a apontar.
Como outros têm liberdade para criticar as escolhas. Mas devem ter consciência de que era o mesmo que obrigar o Álvaro a desenhar o que não lhe apetece (sem lhe pagar...).
Já agora (esqueci-me desta observação), a BD é uma coisa (relativamente) barata. Barato, não é necessariamente rasca.
E só para esclarecer: sendo leitor interessado e admirador do Pedro Moura, não sou seu paladino... Sobretudo quando diz coisas como:
Outros há, e são a fonte da minha influência, que conduzem por um caminho de verdadeira discussão, que erigem os possíveis meios de análise e crítica da banda desenhada, secundarizando a opinião pessoal....
Aliás, acho que as suas opções e discurso, tal como os duas suas influências, muitas vezes apenas obscurecem.
Mas é um trabalho fundamental? Sem dúvida! Dizer isto é contraditório? Nem por isso. Como apreciador de BD (e académico, embora a outro nível) sei que é fundamental haver um discurso de referência desta natureza, e não para encher uns egos por uns dias, mas para chegar a outros públicos importantes que falam a mesma língua (ou desconversam em dialectos diferentes...).
Nem que seja para deles discordar. e Somos todos livres de não ler e mudar de canal.
Também sei que há sempre (mesmo que disfarçadamente, ou até inconscientemente) critérios pessoais em jogo, se os há em ciência (onde, indirectamente, se foram de resto buscar algumas referências), quanto mais em arte...
Mas esta é uma longa discussão, que tem decorrido mundialmente com todas as artes, não só em Portugal e na BD.
Portanto, Venham Mais 5.
Venham mais 5, 10, 20, 100 programas televisivos, editores, autores, álbuns, livros, revistas, jornais e novos públicos.
Nisto, penso eu, estaremos todos de acordo.
Cumprimentos a todos e um abraço ao Pedro Moura.
A gente vê-se na Tertúlia ou na Brandoa.
O facto de se criticar as escolhas de alguém não significa que se pretenda silenciar esse arbítrio livre. Daí estranhar uma interrogação "in terminus" de Isabelinho.
Criticar, bem ou mal, é também um direito. Tal como as escolhas.
Com todo o arrazoado aqui colocado, lá se foi o tempo de uma vinheta na prancha; isto, é claro, para aqueles que o fazem e que o escrevem.
O Lino saiu da polémica porque já deve ter dito tudo o que tinha para dizer. Ao fim e ao cabo, foi ele que "açolou" os comentários, perdoem-me o vocábulo.
Um abraço para todos; um especial para o anfitrião, o sempre incansável Geraldes Lino
Olá, novamente.
Só para que as coisas fiquem claras: nem eu pensava que ao proporem outra escolha e criticarem a que foi feita estivesse alguém a "censurá-la" nem eu me julgo acima da crítica! Acho que todos podem mandar as suas achegas e falei com muitas pessoas antes de ter cristalizado naquele grupo que, como tudos os grupos, se desfazem e refazem 8se fizesse agora, faria a mesma escolha?).
E acho que a super-mega-rifixe crítica sobre este programa é bem-vinda. Significa que viram, ficaram espicaçados, vão gastar dinheiro no DVD e nas T-Shirts e ajudarão a pensar outras vias de apresentar bd noutras plataformas. O João Ramalho Santos, como sempre, é muito directo e perspicaz quando entende que este programa visava atingir outros públicos que não os "normais" (i.e., "fãs" num seu sentido algo pejorativo). E, diga-se de passagem, pelo que me chega, conquistou-se um público muito interessante, e bastante diverso. É verdade que os fãs e colecionadores do "Hulk" e de todos os títulos do "Homem-Aranha" ou os saudosistas monótonos do tempo da Maria Cachucha não gostaram, porque não se falou de a ou de b...
Na verdade, gostava de ter tido mais tempo e tinha falado de muito mais gente. Mas não era esse propósito.
Por outro lado, e ainda aproveito o que o Ramalho Santos aponta e bem: há sempre uma questão e opção pessoal. Claro que sim, não o nego. A questão é que não a tornei acima de outros parâmetros que deveria ter em conta para que fosse um programa minimamente equilibrado. Se tivesse seguido essa vontade, teria mergulhado nas vascas da obscenidade deste autor, e na dissidência visual daquele outro e, quem sabe, tinha mostrado mais dos meus trabalhos geniais para banda desenhada (Opus Gavetae)!
E a minha perspectiva pessoal - e a do Paulo (cujo currículo se construiu noutras esferas e talvez de um modo mais obcuro, por isso não é grave não saber disso) - é que discordo em absoluto do que o Zepe disse. A bd não é rasca. Só é rasca quando o trabalho ou o autor se entregam a obras rascas (rasca numa perspectiva social, sexual, política, existencial mesmo!). A bd é uma cena fixe, barata, descomprometida em termos de responsabilidade criativa (isto é, não temos de pagar salários nem chatear mais ninguém). Mas em termos de responsabilidade criativa não o´é. O "Maus" do Spiegelman não é rasca, nem o autor o fez descontraidamente, não acham? Outros exemplos surgiriam de imediato.
O que me interessa pessoalmente é falar de autores que tenham sobretudo assumido de uma forma ou outra - msmo que não o verbalizem ou não o admitam abertamente - essa responsabilidade. Eu - e não consigo arrancar-me desta pele - acho que estes autores em particular são ALGUNS dos que o fazem. Há outros ainda. Mas há também aqueles que não o assumem e continuam no passeio banal de sempre. Todos têm o seu direito de expressão, trabalho, divulgação. Mas deverão assumir também o grau de respeito que irão arregimentar, o tipo de atenção que vão suscitar, o tipo de públicos que irão conquistar... Para o conceito semi-invisível do VERBD, estes autores conquistaram o espaço desejado pela equipa da produção.
Mas abraço a todos pelas boas ideias lançadas.
Insistam para que passe novamente e para que se façam novos! Apresentem novos projectos! A RTP2 ouvirá os projectos, seguramente. Se quiserem até dou uma mãozinha... Uma espécie de "minuto bd" no Jornal da manhã??
Pedro
A supracitada "boca" dita por Zepe no programa _Ver BD_ revela a atitude camp que deu origem ao underground na década de sessenta (e foi parte do conjunto de factores por detrás do aparecimento da arte pop na década anterior). Não vou caír no erro de dizer que "isso já foi chão que deu uvas" porque nos tempos pós-modernos em que vivemos todos os chãos parecem dar, senão muita uva, pelo menos basta quantidade de parras... Acontece é que já lá vão quarenta anos e a banda desenhada, hoje, não é exclusivamente isto ou aquilo (se é que alguma vez o foi). A banda desenhada é tudo aquilo que os que a criam quiserem. Assim haja criatividade e vontade de fugir ao academismo, ao comercialismo, e a outros ismos do género...
Caro Gerlades Lino, concordo com muito do que disse sobre a escolha dos autores para o programa, mas no que discordo completamente é na avaliação da qualidade da realização do documentário, que me pareceu péssima. Para além dos tiques arty, e da absurda dessincronização da imagem e som, há pouquíssimas imagens do trabalho dos autores, em contraste com planos de pormenor do seu nariz, sobrancelhas e sei lá o quê mais... O cameraman parecia estar bêbedo, e o design dos separadores com aquelas tretas das definições de dicionário tornaram o programa numa espécie de filme de área escola. Muito mau! Gostaria contudo de ver as entrevistas passadas na íntegra
para papel ou disponíveis online, acompanhadas de imagens elucidativas. Daria um bom livro
Boa noite meus amigos.
Tenho pena, mas acho que a banda desenhada, passou a ser um tema erudito, apenas acessível a alguns.
Isso neste programa foi evidente.
As figuras são sempre as mesmas!
Abram as mentes! Procurem a realidade!
Qual é o número real de leitores não circunstanciais de BD?
Porque será que a maior editora de BD portuguesa está permanentemente em saldos a preços quase de oferta?
Já à vários meses que a editora do material Disney deixou de editar revistas, mas o stock era tão grande, que ainda continua à venda.
Perguntem a um míudo de 10 anos se ele quer uma revista de BD e ele vai preferir uma de consolas ou de luta livre ou a Bravo!
O Mosquito e o Tintin tinham preços populares, ao alcance de todos.
Se a BD actual fosse popular, estaria a ser distribuída às portas do metro, como acontece com os periódicos diários.
Eu tenho 46 anos e foi o meu pai e o meu irmão que me habituaram a ler BD. Muita e variada!
Como posso habituar o meus filhos, se não há revistas, ou as que há são para adultos?
Debate-se, debate-se, debate-se, mas não se faz nada que movimente o marasmo em que se está.
Criem revistas, nem que sejam a preto e branco e em papel higiénico!
Façam como no Japão e vendam revistas nas estações que demoram a ser lidas precisamente o tempo da viagem.
Criem! Mexam-se! Vivam!
Labas
É fácil dizer aos outros para arriscarem o dinheiro que não é nosso.
Perdão! Só por curiosidade. Quem pagou o Ver BD?
Vinte e cinco minutos de televisão são muitos. Oxalá que a TVG (televisão de Galiza) comprei esse programa.
"Não deixa de ser paradoxal que o alternativo tenha toda a atenção, enquanto o 'mainstream' é que é marginalizado. É a irónica natureza da banda desenhada, essa estranha coisa a que chamam "nona arte". :)"
Alegra-me saber que esta situação não se produz só em Espanha. Mas tentarei ver o programa.
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